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domingo, 28 de agosto de 2011

Manoel de Barros


Houve um tempo em que as pessoas tinham vergonha de dizerem que gostavam do que era ruim, na verdade, elas conseguiam distinguir, então, quando iam comentar algum programa ruim da televisão elas diziam “Ontem eu estava mudando de canal e...” Hoje ninguém mais tem vergonha de gostar do que é ruim, na verdade, ninguém mais sabe diferenciar o que é ruim do que é bom. Eu, porém, mantenho o senso de qualidade das gerações passadas, mas também tenho muita personalidade para admitir quando gosto de um programa ou de uma música ruim e ai de quem fizer graça. Por isso e, como sou do contra, vou  falar de um programa bom e começar meu texto com “Ontem eu estava mudando de canal e...”
... vi um programa espetacular no Canal Futura sobre um poeta mato-grossense chamado Manoel de Barros. Eu não o conhecia, mas fiquei perdidamente apaixonada. Sabe, eu estava precisando mesmo de um novo amor, e num momento onde não parecia haver mais poetas dispostos a despertar o meu encantamento, ele aconteceu.
Eu não sei dizer o que motivou a minha paixão, mas como paixão verdadeira não se explica só se multiplica, segue um trecho do livro Memórias Inventadas: A Segunda Infância

9. Sobre Importâncias

Um fotógrafo-artista me disse outra vez: veja que pingo de sol no couro de um lagarto é para nós mais importante do que o sol inteiro no corpo do mar. Falou mais: que a importância de uma coisa não se mede com fita métrica nem com balanças nem com barômetros etc. Que a importância de uma coisa há que ser medida pelo encantamento que a coisa produza em nós. Assim um passarinho nas mãos de uma criança em ais importante para ela do que a Cordilheira dos Andes. Que um osso é mais importante para o cachorro do que uma pedra de diamante. E um dente de macaco da era terciária é mais importante para os arqueólogos do que a Torre Eifel. (Veja que só um dente de macaco!)
Que uma boneca de trapos que abre e fecha os olhinhos azuis nas mãos de uma criança é mais importante para ela do que o Empire State Building. Que o cu de uma formiga é mais importante para o poeta do que uma Usina Nuclear. Sem precisar medir o ânus da formiga. Que o canto das águas e das rãs nas pedras é mais importante para os músicos do que os ruídos dos motores da Fórmula 1. Há um desagrego em mim de aceitar essas medidas. Porém não sei se isso é um olho ou da razão. Se é defeito da alma ou do corpo. Se fizerem algum exame mental em mim por tais julgamentos, vão encontrar que eu gosto mais de conversar sobre restos de comida com as moscas do que com homens doutos.

Manoel de Barros.

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